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A REVOLUÇÃO DOS JEGUES

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Publicado em 01/05/2017 | Atualizado em 21/02/2022

Sempre fui um cara criativo. Penso que um dos grandes erros que os organizadores do festival cometem é não separar um tempo no palco principal para apresentar Panelas e penelenses. Algo que possibilite contar a nossa riquíssima história para os visitantes. Imagino que também seria interessante um tipo de espaço para mostrar a arte, a música, a literatura e outras criações da nossa população. Pensando nisso e, notando a ausência de atitude, decidi criar algo para mostrar (chega de ficar só reclamando). Foi assim que imaginativamente decidi escrever a hipotética e improvável Revolução dos Jegues.

Antes de adentrarmos nesta história ficcional é importante salientar que a história não tem nenhuma ligação com a realidade e que qualquer semelhança é mera coincidência. Estamos falando de um mundo imaginário de um artista que usa sua criatividade para produzir imagens e mostrar verdades escondidas sob os tapetes empoeirado das aparências. Então vamos à história que, como falei, não tem nenhuma ligação com a realidade.
***

Era uma vez uma cidade pequena, pacata e ordeira chamada de Chaleira. A cidade de Chaleira era muito conhecida pela sua cultura, sua gente guerreira e sua bucólica suavidade de cidade do interior. Pessoas viviam bem nessa cidade e conviviam, apesar das dificuldades que qualquer povo enfrenta, pacificamente e desenvolvendo-se na medida do possível.

Certo dia, um grande porco apareceu com sacos de dinheiro e entrou na política da cidade com a intenção de ganhar e se manter no poder por muito tempo. Esse porco estava decidido a fazer tudo o que fosse necessário para conseguir chegar ao poder e ganhar mais e mais sacos de dinheiro. Comprou um engenho e se estabeleceu nessa cidade do interior. Sempre que tinha oportunidade conseguia convencer alguns humanos a saquearem os engenhos vizinhos para enfraquecer a concorrência e ganhar mais. Funcionou. O porco conseguiu ganhar mais dinheiro e entrou na política. Quando ganhou a primeira eleição, decidiu que não sairia mais daquela posição e criou um plano para se estabelecer para sempre.

Seu plano era simples: prender aquele povo nas amarras da dependência financeira. Fazer com que famílias inteiras dependesse dele para se sustentar e criar necessidade que somente o poder público poderia suprir. Isso seria impossível se ele não enfraquecesse a mente do povo de tal forma que as pessoas perdessem sua identidade cultural. As pessoas necessitavam de um inimigo externo. Foi assim que o grande porco criou um inimigo que chamou de oposição.

Após criar esse inimigo, ele convenceu as pessoas que deveriam, especialmente em períodos eleitorais, ofender as outras pessoas. Desta forma ele criou rivalidades entre as pessoas da mesma cidade. Mesmo conseguindo obter êxito em tirar a identidade cultural, criar dependência financeira e inventar um inimigo, ele precisava de mais subterfúgios para executar seus planos. Pensando nisso, o grande porco arrumou um jeito de transformar pessoas em jericos completos. Percebeu que não aplicando recursos na educação, não deixando as pessoas se sustentarem sozinhas, ameaçando com frequência e causando medo nas pessoas ele conseguiria alcançar seus objetivos.

Aos poucos o grande porco conseguiu transformar algumas pessoas em jumentas, pois defendiam sem saber o que estavam defendendo, acusavam sem saber pelo que acusavam, ofendiam sem saber o motivo da ofensa. A burrice era tão grande que os jericos de nascença apelaram para que as pessoas não os ofendessem daquele jeito.

Depois de um tempo os planos do grande porco mudaram. Quase dezesseis anos de governo ele percebeu que se quisesse continuar ficando rico às custas do povo, ele deveria apagar a memória do povo de Chaleira. Sim, derrubar as obras de governantes anteriores para colocar outra coisa no lugar. Assim, ninguém lembraria de outro governante senão o grande porco. Foi feito desta maneira e, mais uma vez deu certo.

O grande porco passou a destruir praças e colocar outras praças nos lugares. Passou a destruir grandes obras com aterramentos de todos os tipos e construir coisas no lugar. Passou a impedir que a população daquela cidade fizesse qualquer coisa sem o seu consentimento suíno. Não demorou muito para que a cidade inteira se transformasse em um grande caos. As pessoas passaram a sofrer pelo desemprego, pela seca, pela falta de oportunidades e viajaram para outras cidades para buscar melhoria na vida. Para alguns deu certo. O problema é que longe da cidade o encanto que fazia as pessoas acreditarem que eram jegues foi quebrado e as pessoas passaram a ver que eram pessoas de verdade e que eram inteligentes e passaram a avisar aos que ainda estavam presos.

As pessoas que ainda moravam na cidade e apoiavam o grande porco perceberam a armadilha aos poucos e começaram a questionar. As pessoas diziam que não eram jumentas, que queriam passar em concursos públicos e conseguiriam se tivessem uma chance. Finalmente, as pessoas estavam começando a acordar. Aqueles que sempre souberam que eram pessoas de verdade passaram a ter coragem, ousadia e passaram a convencer outros seres humanos da cidade de Chaleira a se defenderem e tirar o grande porco do poder.

Vez ou outra o grande porco entregava amigos para o abate. Fazia um esquema com porcos da alta cúpula e criava operações para prender bodes expiatórios. Os humanos amigos do grande porco foram presos, alguns inimigos abatidos e a população continuou com medo, apesar de não acreditar mais nas palavras do porco.

Tudo parecia normal, pois as pessoas que não eram jericos e sabiam que eram pessoas íntegras ou ficavam com medo, caladas ou saiam da cidade para ganhar a vida. Outras viviam indiferente, apesar do sofrimento e outras se entregaram e faziam tudo o que o grande porco mandava. Mas o mundo também tinha mudado na cidade de Chaleira, pois as pessoas estavam antenadas nas notícias políticas, sites, redes sociais e, apesar de não se manifestarem muito, sabiam de tudo.

Algumas pessoas criadas como jegues, mas que agora sabiam que eram pessoas de verdade, certa vez observaram o jumento sendo chicoteado por um filhote dos porcos. Notando o tamanho do porquinho e o tamanho do jumento, fizeram algumas observações sobre proporcionalidade e tiraram algumas conclusões inteligentes:

1 – Se o jumento tivesse alguma ideia da sua força isso não aconteceria.
2 –  O porquinho não tem chance contra o jumento em nenhum ponto; nem em tamanho, resistência, força e nem nada.

Foi assim que aos poucos herdaram a força, a obstinação, a resistência, a capacidade de trabalho dos jumentos e se transformaram em pessoas melhores. Passaram a gritar, mandar mensagens, espalhar a notícia de que aquele povo era forte e capaz. Até que finalmente, as pessoas acordaram e decidiram dar um basta.

Os porcos viram que eram minoria. Viram que eram fracos. Viram que não podiam contra aqueles milhares de guerreiros que eram pessoas inteligentes, mas tinham a mesma força e resistência dos animais símbolos da cidade de Chaleira. A população dessa mítica cidade expulsou os porcos, se estabeleceram no poder e fizeram, mais uma vez, a cidade voltar aos trilhos e caminhar para sempre.  O grande porco tentou ocupar alguns cargos eletivos estaduais, mas nunca conseguiu. Sua carreira política foi sepultada ali mesmo. Depois de algum tempo a população de Chaleira viu nos noticiários nacionais o grande porco algemado e preso pela Polícia Federal, pois praticou muitos esquemas de desvio de verbas e alguns outros crimes.

O tempo passou, mas a população nunca esqueceu daquele grande vácuo na história do município de Chaleira. Foram mais de vinte anos de regressão em quase todos os pontos. Mas a população superou e a cidade até hoje não sabe a data da grande Revolução dos Jegues. Alguns dizem que não foi bem assim. Outros dizem que foi, mas o final não é pretérito. É na verdade uma esperança que muitos têm, pois o porco ainda interfere na política daquela cidade. Como é uma história sem ligação com a realidade pouco importa se tiver um “felizes para sempre”, ainda que entre aspas.

Fim


 Inspirado no livro A revolução dos Bichos do escritor George Orwell.

Coluna Política // Por Pierre Logan

Formando em Direito, Licenciando em filosofia, possui formação em Direito Eleitoral, Administrativo, Fundamentos do Direito Público, Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Compositor, gravou no final de 2015 o disco Crônicas de Um Mundo Moderno. Atualmente atua na área jurídica e também é colunista do Jornal SP em notícias. OAB-SP 218968E.


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