“Quem, tendo motivo, não se ira, peca; pois a paciência irracional semeia vícios, alimenta a negligência e excita o mal não apenas os maus, senão os bons”
Hilda Hilst, uma das mais geniais poetizas brasileiras, disse certa vez que estava sobre a “maldição de Potlatch”. Pouca gente sabe, mas potlatch é um ritual realizado pelos ameríndios, índios da costa noroeste, em que a parte mais importante da riqueza da tribo é destruída pelos próprios membros da tribo. Em Panelas acontece uma coisa parecida, no entanto, com um detalhe que faz toda diferença: a destruição da riqueza feita pela tribo era pela glória. A destruição feita pela política panelense é só para destruir mesmo.
A lógica do desgoverno do atual pseudogoverno é o da modernidade líquida, explicada pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman. Não concertar, mas substituir por outro novo, sem saber que esse tipo de ideia deixa a cidade sempre alguns passos atrás do que realmente importa. Em uma cidade em que se busca preservar a cultura, não há de se falar em destruir o antigo para construir o moderno. O novo deve estar a serviço do que já existe. O assessório não substitui o principal.
Do que a cidade vive hoje? Indústrias? Não! Turismo? Não! Será que a cidade pode ser tão ruim que nenhum investidor tenha o mínimo interesse por ela? Será que sua localização é tão desfavorável e que a BR – 104 não nos trás nenhuma vantagem geográfica? Vamos desconstruir os argumentos do governo atual e observar de modo objetivo os atuais desserviços prestados pela atual “indigestão” municipal.
A desculpa vomitada na rádio e em outros meios para a destruição da praça localizada no centro da cidade foi de que ela não era tão útil quanto eles gostariam que fosse. Não sei o que esse governo inútil entende por utilidade, mas não vamos entrar no mérito da questão. Ora, para tornar uma praça “útil” você precisa fazer com que pessoas tenham interesse em estar ali. Um exemplo básico é colocar mesas com tabuleiros, mesas para jogos de dominó e coisas do tipo. Outro exemplo é instalar parques ou pequenos brinquedos para crianças. Não estou inventando nada. Isso já é feito em muitas cidades. Mas ultimamente não vemos nada ser construído em Panelas. Ou as coisas são reformadas (e mudam para pior) ou são destruídas para sempre.
O açude Manuel Miranda não foi reformado, restaurado, revitalizado ou coisa do tipo. Ele foi, ou está sendo, destruído. E no meio de todas as asnices possíveis e imagináveis conseguiram pensar em um aterro, onde seria colocada uma academia. Enquanto grande parte do Brasil sofre com a crise hídrica e muitos municípios começam a cavar poços, nós aterramos um açude. Muitas cidades colocam academias em praças públicas, já existem projetos que vão bem mais além, mas não, em Panelas, querem fazer prevalecer às ideias “jeriquinas”. Não só querem que não exista mais açude como querem ver os panelenses praticando exercícios na beira de um esgoto e respirando fundo um ar tão fétido quanto a oratória dos políticos locais.
Existem coisas não muito compreensíveis que sempre aconteceram em nosso município. Às vezes penso que os alunos que criaram o Festival de Jericos (em 1973) estavam prevendo o tipo de governantes que iriamos ter no futuro. Imagine se passaria pela sua cabeça, amigo leitor, construir um açougue ao lado de um local onde seria depositado todo lixo doméstico e hospitalar da cidade.
Entre prioridades e prioridades você faria uma reforma desnecessária ou criaria algo novo e útil para cidade? Você plantaria ou derrubaria árvores? Você aterraria e canalizaria um esgoto por um dos rios mais importantes de toda região agreste ou limparia esse rio? Você faria reforma nas escolas durante as férias ou esperaria acabar as férias para atrasar as aulas? Se sua resposta for: sim; para o açougue do lixão, sim; faria uma reforma desnecessária, sim; para a canalização de esgoto e aterro de um rio importante, sim; para interromper as aulas de modo irresponsável, então está apto para ser o novo sucessor de Sérgio, Ruben e Cia.
Estão obtusamente destruindo nossas maiores e mais belas riquezas. Estão covardemente atrasando nossas crianças. Estão propositalmente apagando nossa história. Estamos sob uma maldição parecida com a de Potlatch, mas não pela glória. Os mais de 51 milhões enviados pelo Governo Federal em 2014 para Panelas, não foram usados para construir, mas sim, para destruir o que temos (ou tínhamos) de melhor. A maldição de Panelas consiste em ser administrada por quem é inferior.
“Deves ter mais cuidado com o silêncio, pois esse é uma prisão mortal”
Certa vez eu perguntei a meu mestre: “devo ter cuidado com palavras porque elas são perigosas?”- Ele me respondeu: “deves ter mais cuidado com o silêncio, pois esse é uma prisão mortal”. Pedi que explicasse e a explicação foi uma lembrança dolorosa de minha cidade natal. Ele respondeu: “qui igitur ad quae oported, et quibus oported, irascitur, laudatur, esseque is mansuetus potest” (Louva-se, pois, aquele que se ira com que é oportuno, e com quem é oportuno; esse pode manter-se em mansidão) – Completou: “qui cum causa non irascitur, pecat; patientia enim irrationabilis vitia seminat, negligentiam nutrit, etiam bônus invitat ad malum” (Quem, tendo motivo, não se ira, peca; pois a paciência irracional semeia vícios, alimenta a negligência e excita o mal não apenas os maus, senão os bons).
Foi assim que aprendi e agora ensino para o povo panelense: irar-se nesses termos não é contra a mansidão; porque esta virtude compreende dois atos: um é reprimir a ira quando desordenada; outro excitá-la quando convém. Existe um jeito de livrar-se dessa maldição, no entanto, a passividade não é uma delas.
Coluna Política
Por Pierre Logan
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