“Se maldita é a terra, é por tua causa, nela nascerão abrolhos e espinhos para sempre até que aprendas o valor da terra onde nascestes”
How many roads must a man walk down before you can call him a man? (Quantas estradas um homem precisará andar antes que possam chamá-lo de homem?). É com essa pergunta que Bob Dylan inicia blowin’ in the Wind (soprando no vento) uma de suas músicas mais conhecidas e que muitas vezes é tida como trilha sonora dos Direitos Humanos. “Na bica da serra, na serra da bica; saudade que vai, saudade que fica”. É assim que, Brito Lucena, um dos nossos mais ilustres artistas descreve a imagem imponente de uma das mais lindas riquezas naturais do nosso município: a serra da bica.
Se pudesse fazer uma pergunta direcionada a todos os panelenses eu parafrasearia o Dylan e perguntaria: quantas gerações Panelas perderá para que o espírito de luta dos cabanos possa renascer? Não sei se a resposta me agradaria. O que sei é que seja no sopro do vento do Bob, ou na “saudade que vai, saudade que fica” de Brito Lucena, o amor pela cidade que nasci é uma prova cabal de que “não é a terra que pertence ao homem, mas sim; o homem que pertence a terra”.
Nós que nos retiramos fisicamente da terra em que nascemos, seja por questões políticas, econômicas etc., costumamos fazer promessas. Uns dizem que vão para não mais voltar (sempre voltam), outros prometem que vão aparecer sempre que puderem. Minha promessa não foi de ida. Minha promessa foi de que um dia eu iria voltar. Voltar, e fazer a diferença. Eu tinha um emprego na prefeitura, mas via a cidade ser demolida, meus amigos partindo para estudar, trabalhar, enfim; ganhar a vida. Como estar feliz vendo o povo de sua tribo sendo obrigado a fugir ou sangrar até a morte? Como manter o silêncio diante de atrocidades cometidas contra a cultura e a história de seu povo? Conhecendo a diferença entre ser pacífico e ser passivo decidi que jamais abandonaria minha cidade e que manteria esse propósito em qualquer latitude ou longitude do globo.
Não sei se já pararam para fazer os cálculos, mas já vamos para vinte anos que um panelense não governa Panelas. Nesses vinte anos perdemos muito mais que um museu (espaço cultural), uma praça (histórica), ou um açude (Manuel Miranda). Perdemos muito mais que o caminho do desenvolvimento. Teríamos perdido a dignidade ou a coragem de ensinar para nossos filhos a beleza que tem a cabeça de uma pessoa que sangra, mas que não se curva? A singularidade do gesto do agricultor que abraça o chapéu e apoia-se na enxada, não grita, ou agita-se em sua mente quando, por cansaço ou covardia, você decide concordar com a omissão? Você, que aceita tudo calado, já associou sua conta bancária a um velho trabalhador que se envergonha ao ser obrigado a ver a família passando fome? Diga que é mentira. Convença as paredes de que essa não é uma realidade dos recantos mais afastados e escondidos da zona rural panelense, mas, ainda assim, saberá, no fundo do peito, que é verdade e que é responsável. Talvez negue a ultima parte, pois seu silêncio pode ter ensurdecido e envergonhado sua consciência a tal ponto que você se nega a admitir (pelo menos em voz alta).
Não pense que Panelas tem 145 anos. Ela tem muito mais. Costumam contar a idade das cidades a partir da emancipação política, entretanto, nas primeiras décadas de 1800 nosso município já era palco da guerra dos cabanos e já se chamava Panelas. Muito sangue foi derramado, muita gente morreu. Panelas cresceu até certo ponto depois estacionou. Já teve outros nomes. Um deles, inclusive, parece ironia quando comparamos com as terríveis secas que afetam a cidade quase que anualmente. Chamavam de Olho d’água das Panelas. Ironia do destino mesmo ou negligência dos gestores? Foi o que pensei.
Só quero deixar registrado nessa coluna que trago comigo os valores e as lembranças que não permitem que abandone minhas raízes e que meu amor por Panelas pode ser multiplicado por mais de 145 vezes. Que almejo levar isso para todas as pessoas de nossa cidade. Quero que o amor pela cidade de Panelas seja transmitido como um vírus e infecte todos os corações dos filhos da terra em todos os distritos. Desejo e luto para que juntos possamos descobrir qual é a força que nos faz um. Perseguição não será desculpa, na verdade nunca foi; e os cabanos provaram isso.
Descendemos de guerreiros que sangraram e percorreram todas as matas, enfrentaram doenças, fome; inúmeras batalhas, exércitos bem armados e um governo que achou que seria fácil atropelar “um bando de gente matuta, suja e esfomeada”. Provaram o gosto do sangue guerreiro. Desistiram. Nossos antepassados fizeram com que pagassem um preço tão alto que em uma das cartas dos militares, um dos oficiais desejou jamais ter enfrentado os cabanos. É disso que devemos nos alimentar. Quando te humilharem ou te machucarem, te pisotearem e te reduzirem até o ultimo denominador comum do “eu”, então, que encontrem um guerreiro e que saibam o que isso significa. Esse é o caminho que devemos seguir para responder a questão que Bob Dylan colocou em sua canção. Quanto a música de meu amigo Brito Lucena; lágrimas de saudades vieram comigo de uma serra e de um sonho que ficou em Panelas.
Por fim, deixo uma passagem da bíblia, não para os que buscam mudança, mas para os que escolheram o caminho dos covardes, da omissão criminosa e do apoio aos parasitas que enriquecem e tiram o que temos de melhor. A versão é minha e faço especialmente para vocês: “Se maldita é a terra, é por tua causa, nela nascerão abrolhos e espinhos para sempre até que aprendas o valor da terra onde nascestes; porque és pó e ao pó voltarás.” (Gênesis Capitulo 3)
Por Pierre Logan
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